O
DESPERTAR PARA A LEITURA ATRAVÉS DA INTERTEXTUALIDADE NA
CONTEMPORANEIDADE
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Desde
Ovídio (20 e 15 a.C) e suas Metamorfoses,
escrita entre os anos 2 e 8 da era cristã, percebemos a influência
da mitologia greco-romana na humanidade. Autores considerados
clássicos, pela sua contribuição, tais como Homero, Dante
Alighieri e Virgílio, perpetuam em suas obras todo o ingrediente
necessário para o encanto do leitor diante de suas narrativas.
Neste
contexto, o leitor ávido por uma boa leitura, que o proporcione
mergulhar pelas profundezas do imaginário, deixa-se envolver por um
universo que o envolve nesse mundo fantástico que é, sobretudo, um
istmo entre realidade e ficção. Os gregos souberam criar belos
mitos que eternizaram suas mensagens e preservaram a história de seu
povo. O mito e seus deuses tornam-se então fundamentais para que o
ser humano, mero mortal, entenda o seu verdadeiro significado num
mundo em que está inserido.
Sua
visão de mundo limitava-se ao que enxergava em quase tudo que o
cercava e buscava explicações para tudo. Neste sentido, através de
sua imaginação fértil, criaram personagens que sobreviveriam ao
tempo, tais como, heróis, deuses, ninfas, titãs, centauros e
monstros, expressos em enormes narrativas, as
epopeias,
que constituem a literatura grega, exercendo até hoje uma grande
influência na cultura, nas artes e na literatura ocidental.
O
cenário para essa grandiosidade era o Olimpo composto por seus doze
deuses: Zeus,
deus de todos os deuses e senhor do céu, Afrodite,
deusa do amor, do sexo e da beleza, Poseidon,
deus dos mares, Hades,
deus das almas dos mortos e do subterrâneo, Hera,
deusa do casamento de da maternidade, Apolo,
deus da luz, das obras de artes, Ártemis,
deusa da caça e da vida selvagem, Ares,
divindade da guerra, Atena,
deusa da sabedoria, Cronos,
deus da agricultura, Hermes,
deus do comércio e mensageiro e Hefesto,
divindade do fogo e do trabalho. Deste local, comandavam o trabalho e
as relações sociais e políticas dos seres humanos. Apesar de serem
imortais, possuíam características semelhantes aos mortais, tais
como, o ciúme, inveja, traição e a paixão, o que muitas vezes
fazia com que se apaixonassem por mortais e tivessem filhos com eles.
O papel fundamental desses deuses, na literatura, é, além de
enriquecer a narrativa, criar imagens associadas que se fundem com a
própria realidade. Os personagens são partes dessa composição e
contribuem para o envolvimento direto entre o leitor e a narrativa.
A
leitura é, portanto, algo crucial ao desenvolvimento intelectual do
ser humano. Com o advento das tecnologias na contemporaneidade, no
entanto, percebemos que o ato da leitura de livros tem se colocado de
lado, perdendo espaço para salas de bate papo e todo o
entretenimento que a internet proporciona a seus usuários. Este fato
torna-se preocupante quando observamos a postura de alunos cada vez
mais desinteressados pelos livros, contribuindo assim para o baixo
nível vocabular.
É
preciso, portanto, que o professor de literatura estimule seus alunos
desde o ensino fundamental a criarem o hábito da leitura, as fábulas
de Esopo e La Fontaine podem servir de sugestões para a aquisição
desse hábito. Sabemos que a leitura imposta, obrigatória para o
vestibular, acaba surtindo o efeito contrário: o aluno ao invés de
sentir prazer pela leitura torna-se avesso aos livros recomendados
pelo professor, muitas vezes odiando os livros considerados como
clássicos de autores como Machado de Assis, José de Alencar e Lima
Barreto, por exemplo. Neste sentido, é preciso que o professor de
literatura também reveja sua postura perante seus alunos e ao invés
de impor o que se deve ser lido, ficar atento ao que eles estão
lendo. Todorov
(2009) também pensa no estudo/ensino da literatura, questionando
qual é o objeto das/nas aulas de literatura, e conclui que o ensino
da disciplina e o ensino das obras devem encontrar os lugares que
lhes convém.
É
comum ouvir-se dizer que as crianças e os jovens não leem. Diante
deste fato, alguns escritores, para tentar resgatar seus leitores e
alcançar outros novos leitores, utilizam-se da intertextualidade
como recurso para se criar o novo ou até mesmo dar uma nova roupagem
em uma história que já foi contada. É o que percebemos na série
Percy
Jackson e os Olimpianos.
Segundo Meiry
Peruchi Mezari
a série
Percy
Jackson e os Olimpianos: O Ladrão de Raios (vol.1), O Mar de
Monstros (vol.2), A Batalha do Labirinto (vol.3), A Maldição do
Titã (vol.4) e O último Olimpiano (vol.5), escrita pelo
norte-americano Rick Riordan, conta a história de Percy Jackson, um
garoto de 12 anos que um dia descobre que os mitos que conhecia não
são mitos, e que é um semideus – “meio-sangue” –, filho do
deus Poseidon. Na obra aparecem vários deuses famosos da mitologia
greco-romana, menção a obras literárias como a Ilíada de Homero,
“seres mitológicos” e conhecidas histórias que aparecem
integralmente ou em menções n’As Metamorfoses.
O
que Riordan consegue fazer através de sua série é trazer para a
realidade do século XXI a mitologia greco-romana, numa fusão
realidade/ficção, repleta de aventuras, capturando e conquistando o
leitor até o fim de cada história. O autor utiliza-se de várias
histórias da mitologia, numa intertextualidade com os mitos gregos
fazendo o leitor conhecer esse universo, que para muitos é o
desconhecido. Neste sentido, a contribuição maior da obra é
justamente apresentar para esses jovens a importância da literatura
clássica, num enredo adaptado, cheio de aventuras, suspense e,
sobretudo, literariedade.
Outro
livro de mesma importância é As
brumas de Avalon
de Marion Zimmer Bradley. Escrita em 1979, a obra está dividida em
quatro volumes que retratam a história do rei Arthur e os cavaleiros
da távola redonda. A autora cria personagens e ambientes que
reportam o leitor a época medieval com seus cavaleiros e guerras,
narradas pela visão feminina. A lenda do rei Arthur é conhecida e
contada de diversas maneiras, com versões diferenciadas. Nas brumas
de Avalon está presente também a questão tanto histórica,
referente a Bretanha, quanto a questão religiosa inerente ao
paganismo versus cristianismo. Neste sentido, além do professor
narrar a história na visão da autora, poderá também apresentar
para os alunos o filme, que mesmo com pequenas alterações, reflete
fielmente a narrativa do livro.
Em
As
crônicas de Nárnia,
de C. S. Lewis, a intertextualidade se dá com Alice
no país das maravilhas de
Lewis Carroll. Em ambas o portal para o mundo fantástico se abre
como um novo mundo de dentro de um armário. A obra também é
repleta de misticismo, personagens míticos e aborda valores que
estão relacionados a vida do ser humano, numa dualidade que abrange
o mundo real e o imaginário. É importante frisar que ambas as obras
são direcionadas a um público infantil, porém, há características
peculiares e de valores, voltados tanto para jovens quanto para
adultos. As
Crônicas de Nárnia apresentam, geralmente, as aventuras de crianças
que desempenham um papel central e descobrem o ficcional Reino
de Nárnia, um lugar onde a magia
é corriqueira, os animais
falam, e ocorrem batalhas
entre o bem e o mal. O memso acontece com Alice: O livro conta a
história de uma menina que cai numa toca de coelho que a transporta
para um lugar fantástico povoado por criaturas peculiares e
antropomórficas,
revelando uma lógica
do absurdo, característica dos sonhos.
Outra
intertextualidade nas crônicas é que em
todas as partes do romance da série são encontrados, supostamente,
fatos relacionados a acontecimentos bíblicos. Entre eles, o mais
famoso seria o fato de que muitos cristãos acreditam que o
personagem ficcional Aslam
é uma alegoria a Jesus
Cristo; isso se deve ao fato de que o personagem está presente
do início ao fim da história, do mesmo modo de Cristo. Lewis alega
ser uma grande coincidência o fato de que Jesus seja chamado como O
Leão da tribo de Judá, pois o
personagem Aslam representa a figura de um leão. O mesmo acontece
com a fauna
de Nárnia
usando seres ficcionais da mitologia
grega e mitologia
nórdica, como por exemplo: centauros
(mitologia grega) e anões
(mitologia nórdica).
Em
2001, Steven Spilberg lançou o filme AI
– Inteligência Artificial a partir
de um projeto de Stanley
Kubrick, sobre a possibilidade da criação de máquinas com
sentimentos. O enredo baseia-se em um menino-robô que possui um
sonho: tornar-se humano para ser amado por sua mãe. Para isto
acredita que se encontrar a Fada Azul seu sonho será realizado. Na
literatura essa não é a primeira vez que esse tema é abordado:
Pinóquio,
de Cartlo Collodi, tornou-se um grande clássico da literatura
infantil. Ele encanta com o seu desejo de também se tornar um
menino.
Numa
noite, a Fada Azul visitou a oficina de Gepeto (o criador de
Pinóquio). Comovida com a solidão do bondoso ancião, resolveu
tornar seu sonho em realidade dando vida ao boneco de madeira. Em
Inteligência Artificial o
menino-robô demonstra características humanas, acreditando ser ele
também um humano com capacidade para sentir amor. O que mais
impressiona é um robô que procura realizar o seu sonho: tornar-se
amado por sua mãe humana. E isto é possível? Um humano pode amar
um androide como se fosse seu próprio filho? Spielberg deixa
registrado toda a sua sensibilidade ao fazer da história ficcionista
algo que incomoda a realidade atual. Máquina e homem num mesmo
contexto dividindo sentimentos e espaço no mesmo tempo em que
tecnologia e angústias provocadas pela individualidade humana
resistem ainda em prevalecer que o poder do amor é ilimitado.
Contrassenso
que provoca e incomoda por ser tão real. Um robô livre de
sentimentos banais e mazelas psicológicas presentes no homem.
Máquina que chora por dentro sem precisar de lágrimas falseadas
pela hipocrisia da humanidade.
J.
R. R. Tolkien também contribui nessa nova safra de histórias ao
escrever O Senhor dos Anéis. A história
ocorre em um tempo e espaço imaginários, a Terceira
Era da Terra
Média, que é um mundo inspirado na Terra
real, mais especificamente, segundo Tolkien, numa Europa
mitológica, habitado por Humanos
e por outras raças humanóides: Elfos,
Anões
e Orcs.
A história narra o conflito contra o mal que se alastra pela
Terra-média, através da luta de várias raças - Humanos,
Anões,
Elfos,
Ents e
Hobbits
- contra Orcs,
para evitar que o "Anel
do Poder" volte às mãos de seu criador Sauron,
o Senhor do Escuro. Partindo dos primórdios tranquilos do Condado,
a história muda através da Terra-média
e segue o curso da Guerra
do Anel através dos olhos de seus personagens, especialmente do
protagonista, Frodo
Bolseiro.
Todos
esses autores souberam, através de suas obras, utilizar os
ingredientes necessários para chamar a atenção do leitor: uma
narrativa densa, com uma linguagem simples e direta, como faziam os
antigos narradores, resgatando a arte de contar histórias em uma
época em que o tempo é dividido por prioridades. Neste sentido,
baseado na hierarquia de valores, a leitura torna-se a última opção
diante da diversidade tecnológica na contemporaneidade.
Seguindo
ainda a linha desses autores, Stephenie Meyer, e a sua saga
Crepúsculo, é
um exemplo ou até mesmo excessão no que diz respeito a sobresair-se
neste mercado competitivo eletrônico. A série divide-se em quatro
volumes, Crepúsculo, Lua nova, Eclipse
e Amanhecer, compondo um enredo
byroniano com características românticas, envolvendo vampiros e
lobos em ambientes macabros. O grande trumfo de Meyer é justamente
transformar uma história de amor, para jovens, cheia de romantismo.
Crepúsculo poderia ser como qualquer outra história
não fosse um elemento irresistível: o objeto da paixão da
protagonista é um vampiro.
Assim,
soma-se à paixão um perigo sobrenatural temperado com muito
suspense, e o resultado é uma leitura de tirar o fôlego - um
romance repleto das angústias e incertezas da juventude - o
arrebatamento, a atração, a ansiedade que antecede cada palavra,
cada gesto, e todos os medos. A intertextualidade de Meyer é visível
quando comparamos a sua obra a outros autores que já escreveram
sobre o mesmo tema. O primeiro é Drácula escrito em 1897 por
Bram Stoker. O segundo Entrevista com o vampiro de Anne Rice,
escrito em 1976.
Neste
aspecto, a intertextualidade se faz necessária visto que as novas
adaptações literárias, baseadas em outras obras, tornam-se
necessárias para a formação de novos leitores. E neste contexto,
não importa o estilo literário, seja ele um best
seller ou
uma mera adaptação, pois uma
boa leitura nunca pode basear-se em fragmentos isolados do texto, já
que o significado das partes sempre é determinado pelo contexto
dentro do qual se encaixam.
Além
disso, para que haja uma boa leitura, não se pode deixar de
apreender o pronunciamento contido por trás do texto, já que sempre
se produz um texto para marcar posição frente a uma questão sócia–
histórica - científica qualquer. Cabe ao professor de literatura
levar o aluno a reconhecer intertextos e a despertar o prazer da
leitura com a finalidade de adquirir-se não só o conhecimento em
termo de leitura, mas a forma como os textos são construídos e
levados ao público de maneira clara e objetiva.
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